Por: Ascom MPF/PB – Publicado em: 12.11.2018
“O silêncio diz muito e os professores da rede privada estão sendo silenciados. Não é à toa que nesta reunião a gente não veja outros representantes desse segmento”, alertou um professor da rede de ensino privada que participou, na manhã desta segunda-feira (12), da solenidade de entrega formal da recomendação sobre liberdade de cátedra (de ensino) aos gestores de instituições de ensino paraibanas. “Quando a gente silencia, não é porque a gente quer; é porque a gente tem medo. E quando a gente tem medo, não é infundado; existem razões para ter”, denunciou o mestre.
Conforme a recomendação, expedida em conjunto pelo Ministério Público Federal (MPF) na Paraíba, o Ministério Público do Trabalho (MPT), a Defensoria Pública da União (DPU), a Defensoria Pública da Paraíba (DPPB) e a Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional Paraíba, as escolas e universidades paraibanas não devem interferir na liberdade de cátedra dos professores, com argumento que signifique violação aos princípios constitucionais. As instituições de ensino devem também adotar as medidas cabíveis e necessárias para que não haja qualquer forma de assédio moral contra os professores por parte de servidores, professores, estudantes, familiares ou responsáveis.
O professor [não identificado por razões de segurança] confessou que, ultimamente, tem sentido medo de dar aulas. “Eu nasci na democracia, nos anos 80, portanto, só sei viver na democracia. Tenho uma profunda inabilidade de lidar com violência, autoritarismo, com o terror. E o contexto atual vem realmente nos assustando muito. Eu ensino sobre o Estado em várias disciplinas e, discutindo sobre o fascismo e seus vários elementos, nunca imaginei que fosse ver o fenômeno materializado na minha frente: o culto ao nacionalismo, a exacerbação da violência e a profunda insensibilidade com os grupos socialmente vulneráveis, a dificuldade de lidar com o antagonismo, com o contraditório, que é tão importante”, expôs o professor.
Situações como a vivenciada por esse professor, recentes afrontas às garantias previstas na Constituição Federal, notadamente à liberdade de manifestação do pensamento e à liberdade de cátedra, decorrente de casos de agressão e assédio moral aos professores paraibanos, foram questões consideradas na elaboração da recomendação entregue a reitores e secretários de educação. No âmbito do MPF, a recomendação foi motivada a partir de denúncia recebida pela Procuradoria Regional dos Direitos do Cidadão, órgão do MPF, que deu origem ao Procedimento Administrativo nº 1.24.000.001881/2018-26.
Para o procurador regional dos Direitos do Cidadão, José Godoy Bezerra de Souza, “é importante destacar que os órgãos estão atentos e farão o esforço necessário para que a democracia seja respeitada, especialmente quanto a valores essenciais na democracia, como a liberdade de expressão e, para além da questão da democracia, a atuação dos órgãos busca resguardar o ensino”, enfatizou o procurador. “Sabemos que não existe a possibilidade de se ensinar sem a troca de ideias e não existe a possibilidade de se ensinar a liberdade sem que as pessoas sejam livres. Então, a recomendação vem, nesse momento, dar especial atenção aos professores, profissionais essenciais para a sociedade”, explicou José Godoy.
Compareceram à solenidade de entrega da recomendação, os secretários de educação do estado e do município de João Pessoa, reitores da UFPB e IFPB, representante da Reitoria da UEPB, diversos professores da rede pública de ensino superior e representantes de minorias identitárias.
Itens recomendados:
Sem sanção arbitrária – Os gestores de todas as instituições de ensino na Paraíba devem se abster de qualquer atuação ou sanção arbitrária em relação a professores, cujo fundamento signifique violação aos princípios constitucionais e demais normas que regem a educação nacional, em especial quanto à liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber e ao pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas.
Pluralismo de ideias – As instituições de ensino devem incluir em seus programas de prevenção ao assédio moral debates e discussões com professores, alunos e comunidade escolar sobre a previsão contida na Constituição Federal (artigo 205 e seguintes), principalmente sobre a importância do pluralismo de ideias, de concepções pedagógicas e de liberdade de manifestação.
Divulgar Observatório – As escolas e universidades devem afixar cartazes nos quadros de avisos das suas respectivas instituições de ensino, dando publicidade ao Observatório de Violência por Intolerância, entidade multi-institucional criada para receber e dar prosseguimento adequado aos relatos de LGBTIfobia, racismo, violência contra a mulher e demais pessoas que sofram qualquer tipo de ofensa motivada por ato com fundamentação política e/ou por intolerância à diversidade, à liberdade de cátedra ou pensamento e à violência policial decorrente de motivação política após o último pleito eleitoral no Estado da Paraíba.
Denúncias online – O Observatório de Violência por Intolerância disponibilizou um formulário de denúncias online, no endereço eletrônico www.defensoria.pb.def.br. As pessoas que desejarem reportar casos de violência na Paraíba deverão acessar o formulário nesse link e responder sobre o tipo de violência, a razão e o contexto. O sigilo das informações é garantido. Os registros recebidos serão analisados e encaminhados às instituições responsáveis pela apuração dos fatos e pela responsabilização dos agressores. Caberá à Defensoria Pública da Paraíba orientar as vítimas juridicamente e acompanhar casos graves relatados.
Caso não seja cumprida a recomendação, os órgãos recomendantes adotarão as medidas cabíveis e necessárias para que não haja qualquer forma de assédio moral contra professores por parte de servidores, estudantes, familiares ou responsáveis e demais professores da instituição.
Foto: Ascom MPF/PB