Publicado em: 25.03.2020
O Governo Federal deverá suspender os cortes realizados no Bolsa Família dos estados da região Nordeste do Brasil enquanto perdurar o estado de calamidade pública decorrente da pandemia do coronavírus (Covid-19), bem como disponibilizar e justificar a razão da concentração de cortes ter ocorrido na região Nordeste. A decisão liminar foi proferida pelo ministro Marco Aurélio Mello do Supremo Tribunal Federal (STF) na segunda-feira, 23, foi recebida com satisfação pelas Defensorias Públicas do Nordeste, que tinham solicitado o ingresso na ação como amicus curiae .
A ação para suspensão dos cortes foi movida pelos Estados do Nordeste. Ainda no domingo, 22, o coletivo de Defensorias Públicas do Estado da Bahia, Ceará, Piauí, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Maranhão, Paraíba, Sergipe e Alagoas apresentaram ao STF pedido de ingresso na qualidade de amicus curiae, já antecipando as razões sobre o tema. O amicus curiae, significa“amigo da corte” ou “amigo do tribunal”; é a pessoa ou entidade estranha à causa, que vem auxiliar o tribunal, provocada ou voluntariamente, oferecendo esclarecimentos sobre questões essenciais ao processo.
As Defensorias pediram o ingresso na ação expondo o risco de colapso social em virtude da ausência dos benefícios do programa em meio as orientações de isolamento social emitidas pelo Ministério da Saúde. “As instituições pleitearam assim, para além do reestabelecimento imediato dos bolsa-famílias cortados, por total inoportunidade, a implementação dos benefícios ainda em processamento de modo assegurar renda e permitir o isolamento social da população baixa renda, por se mostrar o meio mais efetivo de combate a pandemia”, registra o pedido protocolado no STF.
Na avaliação do defensor público geral da Bahia, Rafson Saraiva Ximenes, o pedido coletivo de amicus curiae foi um ato de união entre todas as Defensorias Públicas do Nordeste, que reconheceram no excelente trabalho das procuradorias estaduais o melhor interesse da população que defendemos. “Parabenizo o trabalho dos procuradores e defensores. O Nordeste precisa desta união”, pontuou.
A liminar proferida pelo ministro ordenou que a União apresente dados que indiquem o motivo de concentração dos cortes realizados até o momento nos estados do Nordeste. Na ação, os estados demonstraram disparidade no número de benefícios concedidos pelo programa Bolsa Família entre as regiões brasileiras, bem como a falta de proporcionalidade no corte de benefícios, em plena crise sanitária.
Os estados denunciaram ofensa aos artigos 3º, II e III, 19, III e 203 e 204, todos da Constituição Federal, que determinam a proibição de distinção entre brasileiros e a necessidade de observância, como objetivo fundamental da República a erradicação da pobreza e redução das desigualdades sociais e regionais, com a criação de benefícios assistenciais, como o Bolsa Família.
Inicialmente o pedido se destinava apenas aos dados das novas inscrições, mas passou a solicitar também a manutenção das concessões após o Ministério da Cidadania anunciar medidas a serem adotadas durante a pandemia do coronavírus, entre elas cancelamentos de mais de 150 mil benefícios.
Os dados apresentados na ação demonstraram que o Nordeste recebeu, entre maio e dezembro de 2019, 3% das concessões de novos benefícios. Já os estados do Sul e do Sudeste concentraram 75% dos novos recebedores. Em 2019, o Nordeste brasileiro contabilizava 939.594 famílias em situação de extrema pobreza sem direito ao benefício. Apesar disso, em janeiro de 2020, foram concedidos apenas 3.035 benefícios, 0.32% da demanda. Na região Sul, que contabilizava no mesmo período 186.724 famílias em situação de extrema pobreza foram concedidos no primeiro mês do ano 29.308 benefícios, 15, 7% da demanda.
No Piauí, por exemplo, foram cadastradas, em janeiro de 2020, 86 famílias, o que corresponde a 0.12% do total de pleitos apresentados ao programa federal. Em Alagoas, foram 111 cadastros de uma fila de espera que conta aproximadamente 76.000 pessoas. Na Bahia, no Ceará, no Maranhão e em Pernambuco, a lista de famílias que aguardam liberação do benefício corresponde a quase 7% da população de cada estado. Já no Rio Grande do Norte e na Paraíba, o índice é de 6% da população.
“Os dados sinalizam a tese jurídica veiculada e o dano de risco irreparável a ensejar desequilíbrio social e financeiro, especialmente considerada a pandemia que assola o país”, diz o ministro na liminar ordenando ainda que a liberação de recursos para novas bolsas deve ser “uniforme” considerados os estados da federação. A ação ainda terá julgamento definitivo, mas não há data prevista.
Foto: Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
Fonte: Ascom DPE-RN