Por: Angélica Lúcio* – Publicado em: 30.11.2017
Uma em cada quatro mulheres já foi vítima de violência obstétrica no Brasil. O tema foi debatido, na terça-feira (28) passada, durante audiência pública realizada na sede da Procuradoria-Geral de Justiça em João Pessoa, e contou com a participação da Defensoria Pública da Paraíba (DPPB) como uma das entidades promotoras, além do Ministério Público da Paraíba (DPPB), Ministério Público Federal (MPF) e Defensoria Pública da União (DPU).
Na ocasião, a Defensoria Pública da Paraíba foi representada pela defensora Remédios Mendes, que coordena o Núcleo de Saúde da instituição. Em sua fala de abertura, ela destacou que é preciso levar educação sobre direitos aos cidadãos para que eles possam conhecer os direitos e exigir a sua efetividade. “Nós somos hoje quase cidadãos de papel. Sabemos que temos os nossos direitos, que estão garantidos em lei, mas eles não estão efetivados”, apontou, revelando que também se descobriu vítima de violência obstétrica ao se aprofundar nos estudos sobre o tema.
“O meu filho foi tirado do meu ventre e ele foi já para fazer o corte do cordão umbilical, para fazer limpeza… E hoje eu sei que não há necessidade de fazer esse procedimento tão de repente. É mais importante, para a criança, para o bebê, ele estar no meu colo, recebendo o meu carinho, o meu calor. Os médicos não fazem isso com consciência de que seja uma violação. Fazem isso porque é uma prática recorrente”.
DAR VEZ E VOZ ÀS VÍTIMAS
A audiência foi aberta pelo procurador-geral de Justiça, Francisco Seráphico Ferraz da Nóbrega Filho que, ressaltou a importância do tema. Para ele, o debate sobre a violência obstétrica necessita de uma profunda discussão com a participação dos diversos atores envolvidos.
Já a 2ª promotora de Justiça dos Direitos da Saúde de João Pessoa, Jovana Tabosa, afirmou que o objetivo é conjugar forças e envidar esforços para uma construção conjunta, dando vez e voz às vítimas de violência obstétrica. “O empoderamento feminino deve ser evidenciado e a mulher deve ser protagonista desse processo”, disse.
A preocupação sobre os casos de violência obstétrica que têm ocorrido no Brasil foi destacada pela procuradora da República Janaína Andrade. Ela apresentou dados de uma pesquisa realizada em 2011 que alertam para a necessidade de se buscar uma solução para o problema: “Uma a cada quatro mulheres sofre maus-tratos no parto”, ressaltou. Segundo Janaína, é urgente a necessidade de implementação das boas práticas, sempre levando em consideração a autonomia do profissional de saúde e a autonomia do paciente. “O direito ao atendimento digno está preconizado em vários ordenamentos jurídicos”, lembrou a procuradora.
Já a defensora regional dos Direitos Humanos da DPU, Diana Farias, ressaltou a importância do acesso à justiça e da importância de maior proximidade entre o Sistema de Justiça, a sociedade e as entidades para dar respostas às demandas, principalmente aquelas que ainda estão reprimidas.
PALESTRAS DE ESPECIALISTAS
Durante a programação, a médica Melânia Amorim, uma das referências em parto humanizado no Brasil, fez uma exposição sobre a violência obstétrica, destacando que ela ocorre quando são realizados procedimentos desnecessários ou prejudiciais, como internação precoce, impedimento da presença de acompanhante, dilatação forçada do colo, toque sem consentimento da mulher e a episiotomia – que é a incisão efetuada na região do períneo para ampliar o canal de parto – sem autorização da mulher.
De acordo com a médica, a violência obstétrica é desencadeada pelo desconhecimento das boas práticas, falta de remédios e equipamentos, falta de infraestrutura, discriminação de classe, cor e etnia, desmotivação dos profissionais, entre outros.
A professora da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e enfermeira obstétrica Waglânia Freitas apresentou uma pesquisa realizada pela Fiocruz, envolvendo mais de 23 mil mulheres. O estudo evidenciou que 52% dos partos no Brasil são cesarianas, quando a OMS recomenda a taxa de 15%. Além disso, 43% das intervenções no parto parto são excessivas. Ela enfatizou ainda que a humanização do parto implica na importância de resgatar a autonomia, o respeito e o protagonismo da mulher.
Durante a audiência, também foi realizada a exposição do projeto de Humanização do Parto do Ministério Público de Pernambuco, feito pela promotora de Justiça da Cidadania de Olinda, Maísa Melo. Ela explicou que o projeto começou com uma recomendação expedida em 2013 para implementação do parto humanizado. Posteriormente, foram promovidos cinco seminários envolvendo todos os municípios pernambucanos para discutir a importância do parto humanizado.
A última palestra da audiência foi proferida pelo segundo vice-presidente do Conselho Regional de Medicina da Paraíba, Roberto Magliano, que falou sobre as diversas violências sofridas pela mulher, principalmente as mulheres pobres e negras.
A mesa da audiência contou ainda com a participação da secretária de Estado da Saúde, Cláudia Veras; a secretária adjunta da Saúde de João Pessoa, Ana Giovana Medeiros; do representante do Conselho Regional de Enfermagem, Emanuel Rodrigues; do professor da UFPB, Eduardo Soares; da deputada Estela Bezerra; da representante do Coletivo de Humanização do Parto, Bruna Graziele, e da diretora do Instituto Cândida Vargas, Ana de Lourdes. A deptuada estadual Estela Bezerra (PSB) e a vereadora Sandra Marrocos (PSB) também participaram do evento.
Fonte: *Com informações do MPPB e MPF