Em ação pioneira da Defensoria Pública, adolescente trans retifica nome e gênero na Paraíba

“O que meu filho quer de coração é ser o que ele é. E eu estou muito, muito feliz. Se ele está bem, eu estou bem. Se ele está feliz, eu estou feliz”. Estas são as palavras de Dona Margarida*, mãe de Isaque*, um adolescente trans de 14 anos que recebeu a decisão favorável à retificação de nome e gênero em seus documentos de identificação, após a Defensoria Pública da Paraíba garantir judicialmente a obtenção deste direito.

A defesa dos direitos requeridos por esta família representa um novo capítulo na história do sistema judiciário do Estado. Esta foi a primeira decisão definitiva que reconheceu o direito de pessoas menores de 18 anos em solo paraibano. Dona Margarida buscou a assistência da Defensoria, contando sobre as dificuldades e constrangimentos enfrentados por Isaque no convívio em sociedade; por possuir um nome, em seus documentos, que não correspondia à sua autopercepção e afirmação como um adolescente do gênero masculino.

No dia-a-dia, Isaque já é reconhecido e tratado no masculino em suas redes de convívio social. Na escola, seu material escolar é identificado com seu nome. E desde os 11 anos, ser tratado por pronomes e adjetivos femininos lhe causa angústia e desconforto. Ele confessa que com a vitória desta ação, um grande peso sai de suas costas. Algo que o faz ter vontade de gritar para que todos conheçam seu sentimento de felicidade.

A coordenadora de Defesa dos Direitos Homoafetivos, da Diversidade Sexual e do Combate da Homofobia da DPE-PB, Remédios Mendes, ressalta que o nome representa uma marca importante de personalidade. “Ele é um elemento de dignidade. Para as pessoas transsexuais, que não se identificam com o sexo biológico com o qual foram designadas ao nascer, o nome ainda é uma barreira para o exercício de sua plena cidadania. Na realidade vivenciada por este jovem, o que lhe faltava era a representação de quem ele é em seus documentos”, pontuou a defensora.

A estagiária da DPE-PB, Clarisse Mack, é mulher trans e foi responsável pelo primeiro atendimento à família. Ela conta que durante o decorrer do processo, os pais de Isaque* mantiveram-se ao lado do filho durante todo o tempo. “Ainda que as pessoas trans tenham o direito garantido a sua autodeterminação e a sua identidade de gênero, com relação a crianças e adolescentes trans, a participação e o respeito dos pais são muito importantes para que estas pessoas tenham uma escuta sensível e um acolhimento que produza autonomia”, ressaltou.

A ação dos pais e a luta diária por garantir a dignidade de seu filho, gerou em Isaque* um sentimento de gratidão. “Eu agradeço aos meus pais por me respeitarem tanto, por me darem tanto amor, terem me criado tão bem e terem começado isso tudo”, expressou o adolescente.

Para Dona Margarida é difícil conceber a ideia de pais que se negam a aceitar e acolher os filhos transsexuais. “Eu vejo muitos casos em que as mães e os pais expulsam de casa ou não querem saber. Mas eu jamais faria isso com o meu filho. Ele é o meu filho”, contou. Ainda assim, o processo de aceitação não foi fácil para ela, mas o amor desfez quaisquer dúvidas sobre o respeito e o acolhimento. “No começo foi duro. Mas Deus acalmou meu coração. Deus me deu ele e só vai tirar quando Ele permitir. E eu tenho fé de que isto nunca irá acontecer. Porque meus filhos são tudo na minha vida”, acrescentou.

O acesso a uma defesa jurídica gratuita por meio da DPE-PB proporcionou a Isaque e a Dona Margarida o entendimento de que seus direitos estão ao seu alcance. “Se ele quer, se ele se ama, não importa que alguém critique. E se alguém criticar eu vou à luta. Eu vou procurar meus direitos, eu vou procurar os direitos dele, porque ele tem muitos!”, disse a mãe.

A Defensoria Pública atuou junto a esta família para garantir a eles o respeito, a autonomia de suas vontades e que os sonhos compartilhados por Isaque estejam mais próximos ao proporcionar a dignidade merecida do adolescente, alcançada nesta ação. “Eu quero me formar em Direito para ajudar outras pessoas trans, quero ser papai, quero ter uma família e poder dar todo o amor que recebi a meu filho ou minha filha. E quero viver a vida de uma forma boa, de uma forma gratificante”, revelou Isaque.

*Os nomes foram trocados para preservar a identidade da família.

Por: Luiz Filho
Imagem: produzida por IA com intervenção da Ascom

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